
O que será que você estava fazendo em abril de 2015? Eu lembro exatamente, porque foi um daqueles momentos em que a nossa vida está prestes a mudar, a gente só não sabe ainda.
No dia 1º de abril de 2015 eu fiz o meu Big Chop, depois de oito meses de transição capilar. Neste texto, vou contar mais sobre todo esse processo de aceitação e transformação.
O que é Big Chop e por que ele é tão simbólico?
O Big Chop é o “grande corte”, que livra o cabelo natural do resquício de química nos fios, por isso, ele acontece logo depois da transição capilar. Tudo começa nessa sequência: primeiro, você decide abandonar o uso do alisamento nos cabelos e aí vem o período de transição.
Essa é uma fase particularmente desafiadora, porque te leva a uma nova versão de si. O cabelo natural começa a crescer e com ele você se vê diferente, mas não só esteticamente. Muda até o seu jeito de se enxergar por dentro e, consequentemente, o seu jeito de enxergar tudo ao redor. Afinal de contas, todas as suas convicções partem da ideia de quem você é.
Foi na transição capilar que eu despertei para provocações sobre o que é beleza e por que durante muito tempo eu não consegui me reconhecer nesse lugar. Quando você lança o olhar sobre os motivos pelos quais começou a alisar os cabelos, essa discussão se amplia e surgem novos termos. Eu entendi, finalmente, o que era autoestima e percebi que ela não estava somente relacionada à minha imagem.
Então, fazer o Big Chop é simbólico, porque representa o rompimento com todas as ideias carregadas de preconceito que somos ensinadas ao longo da vida. É o fim da transição capilar e o começo da jornada com o cabelo natural.

Para mim, foi como me encarar através do espelho, entender que o meu cabelo crespo é bonito naturalmente e o padrão (que eu me esforcei tanto para alcançar), na verdade, não era um lugar confortável, porque não havia pertencimento.
Ou seja, me diminuir para estar mais próxima do padrão dava a falsa sensação de que só assim eu seria aceita, respeitada e reconhecida. Mas faria sentido ser valorizada por algo que eu não sou?
O meu cabelo crespo me transformou por dentro e por fora
São mais de 10 anos desde o dia 1 de abril de 2015, e até hoje esse processo me atravessa. Descubro mais sobre mim e sobre a minha ancestralidade através do meu cabelo crespo.
Quando o Big Chop acontece, uma nova etapa se inicia: a de autodescoberta, experimentação, coragem e ressignificação.

Eu entendi que o frizz é natural, que o volume é bonito e a textura é a riqueza dessa fibra capilar. E sigo aprendendo todos os dias, sobre o meu cabelo, a história que ele carrega, a força política e a capacidade que ele tem de representar a nossa identidade, quem somos e de onde viemos.
A partir da transição capilar e do Big Chop eu decidi compartilhar dicas sobre cabelos crespos em um blog, que depois se tornou um canal no YouTube e hoje é a razão pela qual eu trabalho com a internet. Foi o meu cabelo crespo também que me trouxe até aqui e, sem dúvidas, me ajudou a construir confiança e percepção do meu próprio valor.
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Falar sobre o meu Big Chop é ter a sensibilidade de reencontrar aquela menina que, mesmo assustada e sem tanta informação, iniciou um processo poderoso dentro de si, usando a própria beleza como ferramenta. Sim, essa menina já fui eu — e tantas outras meninas negras que passaram pela transição capilar —, mas hoje somos mulheres potentes, capazes, mais confiantes, protagonistas das suas histórias e em constante evolução.